quarta-feira, agosto 24, 2011

O “Triunfo” do Hip-Hop Nacional...




Início dos anos 70. Cidade de Triunfo, Pernambuco...

A vida do jovem Nelson Gonçalves Campos Filho, sempre foi de muito trabalho árduo no campo como agricultor. Nos tempos vagos, este adolescente corria para a cidade a fim de se envolver com a cultura local e com todas as novidades da época, o que acabou resultando no despertar de sua vocação como dançarino do bloco “Cambina Maracatu”, transformando-o posteriormente em um profundo conhecedor dos ritmos do maracatu e do frevo. Mas não foi apenas a conversão à cultura local que suas idas ao centro lhe proporcionaram. Este jovem franzino conheceu o “Soul” dos afro-americanos se contagiou com a nova proposta. A necessidade de valorização social o levou a migrar para a cidade de Paulo Afonso (BA), com apenas 15 anos de idade, em busca de oportunidades. Lá, Nelson prosseguiu com os estudos e passou a trabalhar como auxiliar de topógrafo na Usina de Paulo Afonso. Tornou-se inevitável o seu envolvimento com as festas black da cidade, inclusive, ele é creditado como o primeiro nordestino a interpretar os movimentos de James Brown e a formar um grupo de dança, “Os Invertebrados”...

1974. Brasília...

Chegando à capital do Brasil, o jovem Nelson concluiu o ensino médio e tornou-se topógrafo, mas sem descolar a atenção das festas, tornando-se um especialista na organização destes eventos. Morou em Ceilândia (considerada na época a maior favela do mundo), em Sobradinho e em outras localidades. Sua popularidade cresceu ainda mais quando passou a se apresentar nos eventos da equipe “Super Som 2000”, onde pôde percorrer por todo o Distrito Federal arrebatando multidões com a sua dança. Sua dedicação ao Soul o levou a organizar caravanas para conhecer os bailes do Rio de Janeiro, na época a Meca da Cultura Black Nacional. No Rio, foi apelidado por Toni Tornardo de “O Homem Árvore”, devido a sua altura e tamanho de cabelo. 

1976. São Paulo...

Formado no ensino médio, Nelson segue agora rumo à Terra da Garoa, com o ímpeto de viver da black music. Morando inicialmente na casa de um irmão que já estabelecido algum tempo na cidade, o soulman iniciou seu intercâmbio junto aos redutos black, o que contribuiu para a formação do grupo “Funk & Cia”. Nasce então o soulman “Nelson Triunfo” para o estado de São Paulo! Cabe ressaltar que o Funk & Cia se tornou um articulador poderoso na pacificação entre adeptos que não se entendiam por conta das rivalidades territoriais, percorrendo por todos os bairros do estado, demonstrando que todos eram iguais e precisavam se unir. Sua ousadia o declarou um embaixador do soul paulistano em novos intercâmbios no Rio, em prol do crescimento dos bailes blacks de São Paulo. Em 1983, o programa de auditório do apresentador “Silvio Santos”, exibido na extinta TVS, promoveu concursos para divulgar uma “nova dança”, vinda dos guetos americanos conhecida como break dance. Nelsão, como também é conhecido, mesmo não dominando totalmente os movimentos dos b.boys, aceitou o desafio e compareceu à emissora. A partir daí, o “Funk & Cia”, passou a levar a break dance às ruas e montou sua base em frente ao Teatro Municipal, tornando-se agora o principal embaixador da Cultura de Rua denominada de Hip-Hop, para todo o Brasil. Devido à má acomodação e a incompreensão da Polícia, eles se mudaram para as esquinas das ruas Dom José de Barros com a 24 de Maio (Centro - SP). Sua insistência atraiu pouco a pouco uma grande gama de adeptos do estilo, até que acabou chamando também a atenção (e a intenção), dos comerciantes de discos e artigos da cultura black, da Rua 24 de Maio e das Grandes Galerias do centro da cidade, que passaram a apoiá-los. “Em 83, surgiu em São Paulo, a ‘Discoteca Fantasy’. Os DJs traziam novidades do exterior – faziam uns scratches. Lá, nós começamos a nos encontrar e a desenvolver o ‘break’. Aí, tive a idéia de trazer o movimento para a rua – como era feito no Bronx, começou na 24 de Maio... A gente tinha problemas com a polícia... Quando fazíamos o ‘moonwalker’ (movimento de andar para trás popularizado por Michael Jackson), o pessoal pedia para levantarmos o pé para ver se tinha rodinha... Era um tipo de mágica, o jogo da cabeça, o movimento do corpo, era como se não tivéssemos ossos! Chamavam a gente de invertebrados. Muitos de nossos movimentos foram extraídos da capoeira e também da dança afro-brasileira”, relembra emocionado Nelson Triunfo em entrevista a revista Sport Wear. Em meados dos anos 80 Nelsão, uniu sua experiência de militância no Movimento Negro, com a sua arte de dança e passou a ministrar também oficinas de dança em parceria com os projetos sociais promovidos pelo governo da ex-Prefeita Luiza Erundina (PT) na cidade de São Paulo, dentre estes o “RapEnsando a Educação”, com itinerância por todas as escolas do município. Mas sua benéfica ousadia estava apenas começando: em 84, ele surpreendeu o público sambando em plena avenida uma mistura de passos que variavam entre o samba, o soul, o funk e o break, garantindo o Estandarte de Ouro, como melhor passista do samba paulistano, pelo GRES Vai Vai. O acontecimento culminou no convite da gravação da vinheta de abertura da novela Partido Alto (Rede Globo), além de algumas intervenções do Funk & Cia em alguns capítulos, colaborando ainda mais para a difusão do hip-hop por todo o país. Nos anos 90 foi convidado a integrar ao projeto da Casa do Hip-Hop de Diadema, apoiada pela Prefeitura Municipal de Diadema, em prol do resgate de jovens em situação de risco, realizando atividades sócio-educativas estimuladas pelos elementos do hip-hop, onde permanece ativo até hoje.

O currículo artístico de Nelson Triunfo se estende a participações inusitadas ao lado de personalidades com Tony Tornado, Gerson King Combo, Paula Lima, Sandra de Sá, Leci Brandão, Tim Maia, Gilberto Gil e Jimmy Cliff provando para juventude sem perspectivas que existe alternativas mais positivas de crescimento na sociedade através de um movimento como o Hip-Hop, sem a necessidade de buscar falsas ilusões no crime e nas drogas...

Em 06 de junho de 2008 o Movimento Hip-Hop Nacional teve um motivo a mais para comemorar o seu reconhecimento como instrumento de influência positiva para a Cultura da Cidade de São Paulo: Nelson Triunfo foi congratulado com o Título de Cidadão Paulistano concedido pela Câmara Municipal de São Paulo, sob a indicação do vereador Chico Macena (PT). O Título de Cidadão é uma homenagem promovida pelas Câmaras Municipais de todas as cidades do país a pessoas nascidas respectivamente nestas ou advindas de outros lugares – como é o caso de Nelson Triunfo, cidadão pernambucano –, mas que tenham contribuído exemplarmente para o progresso das mesmas em quaisquer setores da sociedade. “O título será  uma forma da cidade agradecer a Nelson e ao Movimento Hip-hop pelo enriquecimento de sua Cultura e Identidade, reconhecendo oficialmente a importância do primeiro e de tantos outros, na dança e na música, mas também na educação e na inclusão sócio-cultural de milhares de jovens”, declarou na época o vereador Chico Macena. A cerimônia contou com a presença de autoridades e de várias personalidades do Movimento Hip-Hop e da Cultura Black Nacional como o embaixador do Movimento Black Rio Dom Filó, o cantor carioca Gerson King Combo, o soulman e Ministro-chefe da Zulu Nation Brasil King Nino Brown, entre outros.

Este, portanto é Nelson Triunfo, um homem que traz em seu nome o sinônimo da Vitória e aquém o Hip-Hop Nacional deve pela grande ousadia...

Paz e Respeito!  



sábado, agosto 06, 2011

O Arquiteto do Hip-Hop revela as curiosidades de um Movimento que conquistou o Planeta...

Dia 29 de setembro, "Afrika Bambaataa" se apresentará no “Dia Extra” do “Rock in Rio”, uma data alternativa criada para acolher artistas que conceituam o universo musical e, ao que parece inclusive, são as últimas confirmações do evento. Além do Mestre Afrika Bambaataa, subirão ao mesmo palco “Stevie Wonder”, “Jamiroquai”, “Janelle Monáe” e “Joss Stone”. A entrevista que você apreciará a partir de agora, foi realizado em 2008, em sua penúltima visita ao Brasil.  Seria impossível iniciar este blog sem dar um rápido rasante pela origem do nosso Movimento Cultural. Sendo assim, ninguém melhor do que o seu próprio Criador para fazer as honras da Casa.  Senhoras e Senhoras recebam com o devido respeito o “Mestre Afrika Bambaataa”...

Ele nasceu em 19 de abril de...???? (ainda especula-se o ano de seu nascimento). É oriundo do bairro do Bronx (NY), ex-líder de uma gangue de rua denominada Black Spades e optou pela carreira de “DJ” como um modo de reabilitação. É também o inventor da Universal Zulu Nation, principal escola de ministração de uma filosofia vida capaz de levar às muitas gerações sem perspectivas, em todo o mundo, uma razão positiva para a conquista de seus ideais. Sua experimentação musical (o Electro Funk) revolucionou o “Rap” e influenciou o nascimento dos ritmos Techno (de Detroit), Miami Bass (de Miami), o Jazz mais moderno e o Dance Hall (da Jamaica). Pode-se afirmar inclusive que o Funk Carioca é filho bastardo, inicialmente do Electro e depois do Miami Bass, ou seja, de certo modo, tem seu pezinho na nossa Cultura... Este é Afrika Bambaataa, um dos pais do Movimento Cultural Hip-hop! Em entrevista prestada a mim e ao meu grande irmão e rapper, Nelboy – responsável pela brilhante atuação como intérprete –, em sua penúltima vinda ao Brasil, no saguão do Hotel Ibis (centro – RJ), no dia 10 de abril de 2008, véspera de sua apresentação na Fundição Progresso (Lapa – RJ), Bambaataa mostrou-se muito solícito em esclarecer dúvidas acerca do Hip-Hop e de seu posicionamento diante da sociedade mundial... Creditado ao lado das pessoas ilustres dos DJs Grand Master Flash e Kool Herc como a Trindade Divina do Hip-hop, Afrika Bambaataa percorre o planeta em turnês como “DJ”, porém, trazendo sempre em sua bagagem o compromisso de levar através do Hip-Hop aquilo que a Zulu Naiton mais presa: “Paz, Unidade, Amor e Diversão”...

DJ TR e Nelboy Dastha Burtha.

DJ TR – A origem do “Rap” possui uma relação direta com as raízes africanas?
Afrika Bambaataa – Com certeza, o Rap tem sua matriz na África! Desde o início das civilizações, o Rap é extraído das expressões culturais de inúmeras tribos africanas, através do jogo de palavras e da preservação oral dos GRIOTS... Com os africanos, no século passado, vindos para a América com escravidão, esse Rap já podia ser encontrado e mais tarde nas influências de artistas como “Sly Family Stones” – já no primeiro disco deles –, nos “Watts Prophets” (da Califórnia), nos “Last Poets”, e em estilos musicais criados pelos pretos americanos como o “Jazz Be-Bop” e o “Country” –, que preservavam nas suas músicas as percussões africanas. Até então nenhum desses artistas havia denominado essa performance vocal com o nome de “Rap”; só depois de nós – eu, Grand Master Flash e Kool Herc – termos criado a “Cultura Hip-Hop”, é que o Rap se tornou um ritmo conhecido em todo o planeta.

DJ TR – Uma pergunta que não quer se calar: há alguma diferença entre os Elementos “MC” e “Rapper”?
Bambaataa – Na verdade são similares, mas não são iguais. Para muitos que não conhecem o valor que têm a sigla, “M.C”. – que é o Mestre, o Último Nível, o Conhecimento pleno do Microfone na Mão, ou seja, o Mestre naquilo que faz! –, ambos os termos podem ser sinônimos. O MC pode animar a platéia, apresentar, rimar, fazer curadoria... É infinita a capacidade de performance do MC! Já o Rapper não precisa ter todas as facetas multifuncionais do MC. Qualquer um pode ser Rapper, pode fazer Rap, pode gravar Rap, ter uma carreira de Rapper. Na verdade, existem mais Rappers do que MCs, no real sentido que a palavra “MC” tem.

DJ TR – Muitos alegam que os esportes de ação (skate, street ball, biciross, etc...) sãos Elementos do Hip-Hop. Isto procede?
Bambaataa – Quando criamos a “Cultura Hip-Hop”, só elegemos cinco elementos: “MC”, “DJ”, “B. boy”, “Graffiti” e por último o “Conhecimento”. Na verdade gostaria de fazer uma errata: quando anunciamos inocentemente o Conhecimento como quinto elemento, ele foi de fato o Primeiro Elemento da Cultura, pois nos deu base para criar e desenvolver a “Universal Zulu Nation” e os outros quatro elementos. Como estava dizendo, só elegemos cinco elementos do Hip-Hop, mas por ser uma Cultura que começou na rua, outras expressões de rua se identificaram com a nossa filosofia e nos abraçaram, então são manifestações que se aliaram a nós como o “Beat Box”, a moda urbana (roupas, cabelos e suvenires, etc...), o Street Ball, o Skate e outros mais que se identificaram, por livre e espontânea vontade e passaram a se sentir parte dele.

DJ TR – Podemos afirmar que todos os estilos de “Rap” estão ligados à proposta do Hip-Hop?
Bambaataa Não! Existem inúmeros estilos e cada pessoa faz aquilo que a convém. Isso é muito particular, é o livre arbítrio. Você pode fazer “Rap Gangsta”, “Rap Político”, “Rap” falando de dinheiro, “Rap Consciente” pedindo a paz ou falando de guerra... Cada um tem a sua necessidade de se expressar... Pode também fazer um “Rap Romântico” tipo Barry White, ou Isaac Hayes...

DJ TR – Mas eles não rimavam...! (?!)
Bambaataa As pessoas desconhecem parte importante da história da música Rap: no início, quando o criamos, nós não tínhamos como meta só rimar e sim contar nossas vivências em forma de poesia aliada ao ritmo, e na poesia você é livre. Não é obrigatório rimar... MAS PARA FRENTE É QUE OS GRUPOS COMEÇARAM A MOLDAR AS SUAS LETRAS com mais rimas.

DJ TR – Sexismo, Machismo, Homofobismo, Apologia às drogas e ao crime. Estas são algumas das formas que a Mídia mundial tem retratado a “Cultura Hip-Hop” através do “Rap”, especificamente. Como o Afrika Bambaataa observa esta atitude da Mídia?
Bambaataa – Nós temos que combater a forma errada que a mídia nos apresenta o “Hip-Hop”. E só conseguiremos isso indo às TVs, rádios, jornais e revistas para passarmos o que é a verdadeira Cultura Hip-Hop. Temos de combater também os “DJs” que massificam nas rádios aquilo que eles dizem ser Hip-Hop. Aqui no Brasil, por exemplo, quando ouço rádio, só toca Rap americano... O DJ tem que saber combinar o “Rap da Nova Escola” com o da “Velha Escola”; saber colocar as músicas dos artistas locais; ser mais plural ao tocar e não fazer aquela mesma seqüência e repertório que está habituado só por que a rádio pediu! Assim esse DJ não está sendo verdadeiro com a Cultura Hip-Hop... Não está a representando a real Cultura Hip-Hop.

DJ TR – Para que um indivíduo seja autenticamente um membro do Movimento Hip-Hop, é necessário que ele esteja afiliado à Universal Zulu Nation?
Bambaataa – NÃO! A “Universal Zulu Nation” é para as pessoas que Movimentam a Cultura e primam pela propagação do valor e da autenticidade da Cultura Hip-Hop. Já a Cultura Hip-Hop é expressão cultural, é para todo mundo que quiser fazer parte e, de alguma maneira, se identificar com ela.

DJ TR – Um conselho a todos os Hip-Hoppers Brasileiros...
Bambaataa – Organizem-se, Unam-se, Lutem pelo nosso Povo! Lutem pelos os que estão nas favelas! Ajudem a construir o orgulho desse Povo com campanhas sérias! Usem o Hip-Hop como ferramenta de socialização e não esperem que o Governo tome as rédeas da carruagem gerando alternativas que de nada beneficiarão por completo o nosso Povo... Arregacem as mangas e trabalhem de fato! Em todo o mundo, quando se fala de Brasil, todos querem conhecer como é o modo de vida do nosso Povo... O Hip-Hop precisa ajudar a melhorar as Comunidades... Sejam Empreendedores e saibam investir verdadeiramente em nossas Comunidades!


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